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O vassalo mais fiel

por Joaquim Luís Costa
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Joaquim Luís Costa
Licenciado em Ciências Históricas, mestre e doutor em Ciência da Informação. Historiador.

Pela sua importância para a história nacional, a vida de Egas Moniz tem sido bastante escrutinada, resultando daqui muitas incertezas, sendo uma delas a ida a Toledo, com a corda ao pescoço, após o cerco a Guimarães, em 1127. Uma outra é se ele foi o aio do primeiro rei. 

Segundo reza a história, Egas Moniz de Ribadouro foi o aio de D. Afonso Henriques e seu leal conselheiro, como exposto no anterior artigo. A par desta versão, outras versões surgiram baseadas em crónicas e estudos históricos, em lendas e em “histórias” — algumas delas tendenciosas, como as de João Soares Coelho (?-c. 1279) que, procurando projeção social, narrou à sua maneira as proezas de Egas Moniz, seu trisavô por linha bastarda.

Egas Moniz. Imagem Câmara Municipal de Penafiel

Para complicar, há quem afirme que Afonso nasceu com as pernas coladas às costas, o que era um problema porque se acreditava que um dia seria rei e não poderia ser “imperfeito”! Esta eventual enfermidade deu azo a diversas fábulas. Uma delas refere que a Virgem Maria apareceu a Egas Moniz, quando estava em terras de Resende, e pediu que colocasse a criança em cima de um altar e que ficasse a rezar durante a noite. Ele assim o fez, e o milagre aconteceu: Afonso ficou curado da enfermidade! Para agradecer, Egas Moniz mandou construir o Mosteiro de Santa Maria de Cárquere. Uma outra versão conta-nos que o nobre tinha um filho da idade de Afonso e que se fez a troca das crianças. E há quem acredite que Egas Moniz foi escolhido para aio porque era o pai da criança e queria ficar perto do seu filho, o que era natural! Há também uma alusão a que o aio levou a criança de Guimarães para Chaves na tentativa de o curar nas águas termais dessa localidade, mas Afonso faleceu na viagem. Porém, o aio, ao cruzar-se com um pastor com um filho de idade aproximada à de Afonso, todavia saudável, comprou o filho ao pastor. Depois, seguiu para Chaves onde, durante vários anos, o educou.


Mosteiro de Santa Maria de Cárquere (Resende). Foto: Rota do Românico

Mas a questão não se fica por aqui. Há quem sugira que Egas Moniz não foi aio, nem pai e muito menos trocou ou comprou a criança. Ricardo Raimundo, citando o historiador Bernard F. Reilly, sugere que o nobre seria pouco conhecido até 1135, porque a autoridade familiar e política era Ermígio Moniz, seu irmão. Este foi o primeiro conselheiro do infante Afonso e ocupou importantes cargos na Corte entre 1120 e a sua morte, em 1135, e que ele poderia ter sido o verdadeiro aio. Mas como faleceu precocemente e sem descendentes, quem ficou com a fama e o proveito foi o seu irmão, Egas Moniz. 

Todas estas versões fazem parte da nossa história e do nosso património lendário, embora, inocentemente, causem alguma confusão histórica e desvirtuem a vida desta personalidade! 

Na minha opinião, a interpretação correta é a primeira, apesar de ser complexo escrever assertivamente sobre alguém que viveu na Época Medieval. Mas todos temos a liberdade de defender a melhor opção ou entender o assunto como “uma questão meramente de Fé”, como escreveu o professor José Augusto de Sottomayor-Pizarro. 

Independentemente da nossa escolha, uma coisa é certa: Egas Moniz fez tudo por Afonso Henriques e por um Condado Portucalense independente. Foi, assim, o vassalo mais fiel!

Para melhor compreensão do tema, sugiro a leitura da comunicação “Dom Egas Moniz de Riba Douro, o Aio entre o mito e a realidade”, de José Augusto de Sottomayor-Pizarro, apresentada nas Primeiras Jornadas Históricas, realizadas em Guimarães, em 2019.

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