Joaquim Luís Costa
Licenciado em Ciências Históricas, mestre e doutor em Ciência da Informação. Historiador.Embora albergue serviços da Direção Regional de Agricultura e Pescas do Norte (DRAPN), a Casa de Sergude, situada em Sendim, concelho de Felgueiras, pelo seu potencial histórico, lendário e arquitetónico, merecia ser melhor aproveitada para espetáculos e atividades culturais
Na Idade Média, a Casa de Sergude foi bastião da família Coelho, linhagem com origem bastarda na família dos de Ribadouro, uma das linhagens principais da criação da nossa nacionalidade.
Aliás, diz a lenda que, originalmente, Sergude pertenceu a Egas Moniz e que este passava grande parte do tempo aqui, devido à proximidade de Guimarães, onde se encontrava a Corte, e que na capela da casa ficou uma imagem de Cristo Crucificado que lhe pertencia.
A Casa está também ligada a um dos assassinos de Inês de Castro (c. 1320-1355). Segundo reza a história, Pêro Coelho foi quem decidiu o destino de Inês, aquando da reunião onde estiveram Diogo Lopes Pacheco, outro dos assassinos, e o rei D. Afonso IV (1291-1357). E a vingança de D. Pedro I (1320-1367) foi terrível para os Coelhos: além de lhe confiscar todos os seus bens — incluindo Sergude —, mandou que o coração de Pêro Coelho fosse arrancado pelo peito. Este episódio da nossa história não terminou com a morte de Pêro Coelho. Perpetuou-se através de uma lenda que nos diz que Inês de Castro, no dia 7 de janeiro de cada ano — dia e mês da sua morte —, vagueia pelos jardins de Sergude, não querendo ser incomodada, caso contrário, o bom jardim dos Coelhos transformar-se-á num mau jardim.
Conquanto D. Pedro I tenha confiscado aos Coelhos os bens, estes voltaram para a família quando Gonçalo Pires Coelho, filho de Perô Coelho, apoiou Mestre de Avis, futuro D. João I (1357-1433), na Crise de 1383-1385.
No século XVIII, Sergude esteve envolvida num outro episódio nacional: Gonçalo Cristóvão Teixeira Coelho Mesquita foi mandado prender, em 1761, por Sebastião José de Carvalho e Melo (1699-1782), futuro Marquês de Pombal, mas por então Secretário de Estado dos Negócios do Reino, por suspeita de auxílio à fuga de José Policarpo de Azevedo (c. 1735-c. 1783), criado do duque de Aveiro, o qual era acusado de ter atentado contra a vida de D. José I (1750-1777), em 1758. Mas as discórdias com o ministro eram antigas. Quando era ainda “moço”, o futuro Marquês de Pombal desejou casar com uma senhora desta casa. A sua pretensão foi negada pelos Coelhos com a afirmação “No bom jardim dos Coelhos não se cultivam Carvalhos”.
No início do século XX, a família Teixeira Coelho vendeu a Casa a Luíz Gonzaga da Fonseca Moreira que a restaurou e ampliou para sua habitação, mediante projeto de espírito medievalizante do prestigiado arquiteto portuense José Marques da Silva (1869-1947). Mais tarde, Sergude foi doada à Câmara Municipal de Felgueiras, para fins públicos e comunitários.
Atualmente, alberga os Serviços da Estação Experimental de Fruticultura e Viticultura da DRAPN. A propriedade possui dezanove hectares, destacando-se a casa, a capela e o jardim.
Após o escrito, esta Casa dava ou não um filme? Quem diz um filme, diz outros espetáculos e ações culturais. Esporadicamente, realizam-se atividades. Mas, pelo seu potencial lendário, histórico e arquitetónico, as atividades deveriam ser frequentes. Ou seja, cumulativamente com a sua função principal, a Casa de Sergude poderia ser mais bem aproveitada pelo Estado e pelas instituições locais. Merecia, igualmente, passar por obras de conservação e salvaguarda.
Para melhor compreensão do tema, sugiro a leitura da comunicação “Casa de Sergude, Felgueiras: história e documentação familiar”, da minha autoria, apresentada no 5.º Congresso Casa Nobre – Um Património para o Futuro, em Arcos de Valdevez, em 2017.