
Joaquim Luís Costa
Licenciado em Ciências Históricas, mestre e doutor em Ciência da Informação. Historiador.Neste mês de setembro iniciam-se as aulas em todos os níveis de ensino. Por este motivo, esta nota de opinião é dedicada à língua portuguesa, porque tem sido desvalorizada, embora seja o nosso maior património.
Quando o assunto é a «situação» da língua portuguesa, o que é especialmente noticiado e comentado é o Acordo Ortográfico (AO) e a influência do português do Brasil sobre o português europeu. Muitos comentadores têm analisado o assunto, evidenciando, sobretudo, os contras, e muitos escritores recusam-se a escrever sob o desígnio do AO.
Mas será que a variante brasileira e o AO são as únicas preocupações que devemos ter com o nosso idioma? Penso que não. Há outras. Uma delas é a substituição de modo fútil e, mais ou menos, oficial da nossa língua por outras, em especial pela inglesa, nos mais variados domínios.
Por diversas razões, mas sobretudo laborais, a língua inglesa já entrou de tal forma no nosso quotidiano que, espontaneamente, a acolhemos em detrimento do nosso idioma. As palavras feedback, download ou e-mail são disso exemplo.
Há meses, num evento em Espanha, uma cidadã portuguesa, da «alta sociedade», perante uma pergunta em português de um jornalista de um canal de televisão nacional, decidiu responder em inglês.
Realizou-se em Portugal um congresso em que a quase totalidade dos participantes e oradores eram portugueses. Os restantes eram espanhóis. Mas perante uma pergunta em português de um participante ao orador, ambos nacionais, este último respondeu-lhe em inglês.
Ao agirmos desta maneira estamos, inconscientemente, a desvalorizar a nossa língua e, a pouco e pouco, a ajudar ao seu enfraquecimento e à sua substituição. Isto não é bom! Mas há mais.
Atualmente, temos instituições do ensino superior público nacional que estão a alterar a sua designação ou a apresentá-la, em realce, em inglês, remetendo para segundo plano a denominação na língua portuguesa. Desconheço as razões que motivam a mudança. Será moda? Será a necessidade de serem reconhecidas além-fronteiras?
Todos sabemos que a língua inglesa é universal, usada por tudo e por todos, é língua dos negócios, da ciência e da informática. Nada contra. Há estudos que demonstram que a presença de outras línguas no quotidiano é uma mais-valia, sendo o resultado da globalização e a oportunidade para se abrirem novos horizontes educativos e profissionais. Certo, e concordo. Contudo, não nos podemos esquecer que há sempre dois lados. Por muito que algo se apresente como positivo, há sempre o seu oposto. É como os medicamentos que combatem determinada doença, mas podem causar efeitos secundários. É aqui que está o cerne da questão: o problema é quando à luz da globalização e de outros motivos positivos se esquece o que a massificação ou a imposição de outros idiomas fará à nossa língua materna a longo prazo.
Agora, discutimos a influência do português do Brasil. Mas será que daqui a algum tempo não estaremos a discutir a influência maciça do inglês no português? Será que daqui a alguns anos não teremos comentadores e escritores a recusarem escrever em português com influência inglesa como o fazem agora em relação ao «brasileiro»? Temos de aprender com a história, porque quando não aprendemos há a tendência para a situação se repetir, o que significa que ainda não aprendemos a lição! Ou seja, as línguas estrangeiras devem ser utilizadas com parcimónia.
No caso das instituições de ensino nacional, penso que devem privilegiar a nossa língua e não secundarizá-la. Portugal deve afirmar-se em todos os domínios e sempre em português. Se atuarmos desta forma, demonstramos identidade e respeito próprios. Estar na vanguarda do ensino e da cultura é primeiramente valorizar a nossa língua. Considero que deve existir cuidado e respeito institucional para com a língua de Camões, de Eça de Queiroz e de Saramago.
Peço aos estudantes, em particular, e aos leitores, no geral, para que não desvalorizem a língua-mãe e se lembrem de Fernando Pessoa quando escreveu “A minha pátria é a língua portuguesa”.
Se há o cuidado de valorizar o património material e imaterial nacional, o mesmo cuidado terá de ser alargado à língua portuguesa, porque é o maior de todos os patrimónios.
Para aprofundar o assunto, sugiro a leitura da crónica Língua Portuguesa. Valioso património, de José Paulo do Carmo, publicada no Diário de Notícias, na qual o autor escreveu que“O potencial da nossa língua é imenso. Talvez seja a única coisa em que somos realmente grandes”.
5 comentários
Os brasileiros deviam valorizar mais a língua portuguesa, não apenas os brasileiros mas também os portugueses e angolanos
Comentário de caca.
Atacar os brasileiros porquê? Depois lá vem uma camuflagem com os portugueses e os angolanos. E o resto dos PALOP? Não existem?
E quais deveriam ser as traduções de feedback, download e e-mail?
Pela chamada «lei do menor esforço», praticamente ninguém usa a expressão «correio electrónico». A tradução de «descarregar» para inglês é «unload», não é «download». E sobre a tradução de «feedback» fica a curiosidade, sem comentários.
Todas as línguas incorporam estrangeirismos e o português não é seguramente excepção. Antes dos inglesismos tivemos galicismos mais que muitos e antes castelhanismos. Até germanismos temos.
Já o facto de oradores em eventos conduzidos em português (e outras situações, como foi exemplificado) se porem a responder em inglês, a questão é outra, claramente. E, isso sim, não faz qualquer sentido além do exibicionismo «de alta cultura».
Sim, Fernando Pessoa teve a visão real e global, que é bem evidente na diáspora: é a nossa língua que mais une os portugueses lá fora.
Cá dentro, há muita ingenuidade no uso da língua portuguesa, mas pior ainda que o “inglês internacional”, é a teoria dos “entendidos”.
O “fenómeno brasileiro” é imparável. Todos os dias os brasileiros inventam novas palavras. Não há acordo ortográfico que lhe resista. É assim mesmo.
O que há a fazer é não deixar deteriorar o português de Portugal, em Portugal e nas relações internacionais, mormente no seio da CPLP.
Será bom para todos. Teremos uma língua comum, de referência e sem deturpações.
Não teremos é que ir contra o “embalo brasileiro”; é o jeitinho mesmo deles…
Muito menos, teremos que permitir “teóricos”, misturarem na nossa língua, uma imparável corrente linguística, que é a realidade popular brasileira, no Brasil e na sua imensa diáspora; que nada iria causar mais que complicar e deturpar, como foi o caso do último Acordo Ortográfico, que deturpou a língua portuguesa e não teve qualquer impacto no “português do Brasil”, porque no dia seguinte à sua implementação, já estava desactualizado lá e confuso e malquisto cá.