
José Pedro Barbosa
Licenciado em Jornalismo, Comentador de Basquetebol e antigo Maestro. Encontra na Música e no Desporto alguns dos prazeres da vida.Durante séculos, as Bandas Filarmónicas vão servindo como pilar da música instrumental em Portugal. Entre instrumentistas de Sopro e Percussão, o universo profissional da Música está repleto de Filarmónicos, que começaram a ler as primeiras pautas na sua Banda.
Mais do que uma mera influência no percurso profissional de uma pessoa, as Bandas Filarmónicas são um exemplo que perduram para sempre na memória de quem já não vive intensamente um mundo um pouco diferente de todos os outros. Como qualquer grupo, as Bandas não escapam às complexidades humanas e sociais da vida, não existindo uma utopia e um universo em que tudo está sempre bem. Mesmo assim, as oportunidades para vivenciar momentos únicos e criar laços que se alongam no tempo são das melhores coisas que as Bandas podem oferecer.
A história de muitos Filarmónicos (não todos) inicia praticamente da mesma forma. Desde muito jovem, há uma vontade, seja própria ou da família, para aprender um instrumento, para ter uma atividade que não seja apenas ligada ao mundo escolar. Talvez tenha sido numa romaria que viram uma Banda pela primeira vez, ou um familiar que já tocava, mas os motivos aglomeram-se para dar início a uma viagem inesquecível.
Para muitos, aquelas primeiras lições de solfejo são um autêntico pesadelo, em que olhamos para símbolos e nos indicam que ali está uma linguagem nova, quando, por vezes, mal sabemos ler e escrever. Aos poucos, tudo se vai tornando mais natural, até que experimentamos pela primeira vez um instrumento, e a reação é praticamente a mesma, um estado de felicidade por chegarmos a este momento e de perplexidade por não percebermos a melhor forma de extrair o máximo daquela ferramenta mágica.
Depois de meses, anos de prática, de treino, vamos ao nosso primeiro ensaio, aquele em que vemos os nossos futuros amigos, companheiros e, quem sabe, familiares. O Maestro, o líder de um grupo que coloca gerações diferentes lado a lado com o mesmo propósito, introduz o novo Músico a todos os presentes, perguntando se já estudou alguma “marcha” para todos poderem tocar.
Parece mesmo um mundo diferente. Aquelas sextas-feiras à noite tornam-se uma rotina imprescindível, em que a conversa é posta em dia, as peças são trabalhadas e, no final, há sempre lugar à descompressão de toda uma semana de trabalho ou estudos.
Depois dos ensaios, vamos testar a farda da Banda, a roupa que nos vai acompanhar nos próximos anos, enquanto não crescemos claro, mesmo a tempo da primeira Romaria, da primeira Procissão, do primeiro Concerto, esses momentos em que tudo parece ainda mais surreal, em que vemos os pais a celebrar e a ouvir com uma atenção redobrada.
Durante o Verão, todos os Domingos passam a ser uma aventura diferente, levantar bem cedo, chegar bem tarde, passeando um pouco por todo o País para fazer aquilo que mais gostamos, de celebrar e elevar uma Arte que, por si só, é fundamental para a vida de todos nós, seja qual for o seu estilo.
Pelo meio, existem Convívios, Concertos, Concursos, Romarias, Procissões, enfim, muita coisa para enumerar neste singelo texto. Mas, para todos, esta não é uma Vida que dura para sempre, seja por motivos profissionais ou pessoais, não é fácil continuar a sacrificar dias e dias para que estes momentos não acabem.
O que é importante e o que verdadeiramente fica para sempre são as lições que aprendemos, os momentos únicos, e as competências que nos ajudam a melhorar em todas as áreas da nossa vida. Saber que quando um falha, todos falham, aprender a alcançar resultados em grupo e trabalhar arduamente para melhorar todos os dias, perceber que a consistência é o único caminho para conseguir os objetivos que queremos, entre muitas e muitas outras lições.
Durante 14 anos, entre 2003 e 2017, a vida Filarmónica ativa do autor deste artigo foi passada na Banda de Música de Cete, associação que celebra, este mês, o seu 188º Aniversário. Como Músico, Professor, Maestro e, acima de tudo, Pessoa, agradece todos os dias o momento em que, com a sua Flauta Transversal, tocou com o seu avô, com os seus tios e com os seus amigos pela primeira vez, momento esse que acabou por ser repetido e repetido, nunca da mesma forma, durante anos e anos.
Já com a sua batuta, relembra a importância de passar esta alegria a quem se junta a este Mundo pela primeira vez e como é fundamental continuar a incentivar quem há décadas e décadas permanece neste caminho único.
Entre momentos ímpares e desafios, as Bandas Filarmónicas, numa simbiose entre Maestros, Professores, Diretores e Músicos, procuram trazer o melhor de cada um como um todo, por estradas que nem sempre são de piso confortável, mas por onde o destino procura valer sempre a pena.
Há quem siga o caminho profissional na Música, há quem opte por outros caminhos, continuando a fazer parte de uma Banda Filarmónica e há quem tenha de deixar esse universo para trás. A verdade é que todos são influenciados por estes momentos, perduram no coração de cada um e moldam aquilo que virá.
Felizmente, a história deste eterno Filarmónico é a história de muitos outros, espalhados pelo Mundo, pelo País e por uma região como o Vale do Sousa, unidos pela mesma causa que faz deles as pessoas que são hoje.
Uma vez Filarmónico, para sempre Filarmónico.